Homem Magro - Tanto quanto percebi, tem persistido em ser ele mesmo, dia e noite; e é isso que está na base de tudo o resto.
Peer Gynt - Ele mesmo? E o vosso domínio inclui gente dessa?
Homem Magro - É como lhe digo; a porta está sempre escancarada. Lembre-se que existem duas maneiras de um homem ser ele mesmo; um tecido tem o direito e o avesso. Sabe, inventaram recentemente em Paris um método para fazer retratos através da luz do sol. Podem fazer uma imagem semelhante ao original ou aquilo a que chamam um negativo - neste último, a sombra e a luz estão invertidas; para o olhar desavisado, não é muito bonito; mas, seja como for, a semelhança está lá e basta apenas revelá-la. Se, na conduta da sua vida, uma alma se fotografar para produzir um negativo, não será poir isso que destruirão a placa; enviam-na para mim. Tomo em mãos o resto do processo e avanço com uma transformação. Lanço-lhe vapor, mergulho-a, queimo-a, limpo-a, com enxofre e outros ingredientes, até obter a semelhança que a placa deveria ter - ou seja, aquilo a que se chama um positivo. Quando, porém, como no seu caso, está meio apagada, não há enxofre nem lixívia que sirvam.
Peer Gynt - Então, chegam até si cobertos de fuligem e abalam como neve? - Posso saber qual o nome desse negativo que o senhor agora está à beira de transformar em positivo?
Homem Magro - Sim - Peer Gynt.
(Henrik Ibsen, Peer Gynt, Acto V, Cena X)