sexta-feira, 24 de julho de 2009

"um dia vou chegar a um carpinteiro e pedir-lhe que me faça a cama"


"My house of my spirits"
[memória descritiva alheia]

"Gosto de andar perdido na casa refazendo caminhos que vão dar ao mesmo sítio por partes diferentes.
Uma pequena casa em lisboa, com portas de lisboa e luz de lisboa.
Anda-se nela à roda, como se fosse grande. Mas é pequena - pequena.
Sala:
aqui ouve-se de Schuman a Panque-Roque feito noutras casas - dessas com marquises. Esta sala tem o seu som e é gloriosamente simples! e pequena.
é a mesma que se banalizifica quando se acende a televisão que parece um ovo cinzento ligado aos esgotos e riachos belos do mundo - inteiro.
No nicho ao comprido, depois da sala, onde comprimo livros e caixas de música, objectos e coisas naturais - sobretudo de madeira seca e áspera e de pedra muito macia, há um sofá côr-de-laranja que parece posto como um assento num cockpit a apontar para um grande canyon, ou para uma clara fresta por onde a imaginação e a calma das coisas que voam do ar para a cabeça passam.
O chão, que tudo liga, range num certo sítio, e os móveis, mesmo quando se está sentado, mexem-se e estalam. Enfim, as coisas também têm os seus bailes - meio parados.
Esse corredor é um prelúdio. Quando se vê parece tão digno e tão corredor! comprido, com objectos - mais objectos - de ver de esguelha, ainda mais encostados que os livros comprimidos da saleta do sofá côr-de-laranja.
Mas são só três passos e já acabou. Só parece mais comprido porque tem um meio. Que é onde a tábua range.
Dali vê-se - a olhar para a frente e para trás - a casa toda, de uma parte à outra.
Numa ponta tem Bach, noutra barulhos de pessoas num quintal.
No meio tem calor, cheiro e vestir de madeira e coisa cómoda de estuque. A luz eléctrica, quando se acende, é como ele, não o muda. É-o mais ele ainda - breve.
E nesse quarto que queria mais branco ainda, estão as coisas baixinhas. A cama... não sei que dizer ao olhá-la: cansada? velha, fraquinha, meio derreada, sem nenhum encanto de coisa velha, só aquele ser velho de material que sabe mal resistir à função - nada de madeiras. Mas é doce.
Um dia será. Não tinha ainda pensado nisto, um dia vou chegar a um carpinteiro e pedir-lhe que me faça a cama!
Bem, esse quartinho, sem nada de especial, é bonito, tem uma janela clara de onde adoro sentir chegar as madrugadas, de cima, com os barulhos excitados dos pássaros inquietos de chilrear a luz.
Dá para o quintal, ali à mão de semear, mas para onde não podemos ir.
O melhor é o muro/parede alta do fundo, irregular, com um cinzento que parece sempre novo e molhado. um cinzento irregular.
A cozinha é a cozinha.
tem um feio chão.
A casa-de-banho é como se um armário ao alto tivesse dentro uma janela por onde se engasga uma grossa laranjeira que repete o que se vê do quarto, e ouve.
A água da torneira tem boa presão, e isso sabe bem.
tinha que ir tomar banho (e aqui estou, d'emplão, sentado, mesmo a ir) mas assomou-se-me assim esta casa. olha até gosto, e até te adianto o pedido, muito convencido, sim podes pôr no teu post. mas não ponhas nomes, tá bem."


(Tá bem. Como se fosse preciso nome. O Reboliço não editou nada. Nadinha mesmo. O "de em pelão", que é feíissimo assim por extenso, ficou como estava. Lisboa sem letra capital, sem nada. "Presão" da água sem pressão nenhuma. E blogue ficou "post", o que é que haveria de ficar?)