sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Natal a sério

O Reboliço lembra-se de como era o Natal na sua infância: saía de casa na manhã de 24, para fazer quase duzentos quilómetros e ir para a aldeia. A casa do resto do ano ficava vazia, não tinha árvore nem presépio. Ali não era o lugar do Natal. Os lugares de Natal eram à roda do lume, um frio seco na rua e, na cama, as muitas mantas pesadas que ganhavam gotas do bafo do focinho na orla de lã. Na árvore, uns dois ou três ramos de pinheiro que o tio trazia da mata e que se armava muitas vezes no próprio dia 24 com irmãos e primos, pendurava-se sombrinhas de chocolate Regina. Eram duras de comer, demoravam-se na boca e no final sobrava um cajadinho de plástico branco. Não se ouviam sinos - nem na aldeia. Os cânticos ficavam para as Janeiras, uns dias depois. Tem ideia de uma vez se ter posto à escuta atrás da porta do quarto, à espera que chegasse o Pai Natal. Encostou com força as orelhas à madeira mas só ouviu do outro lado a voz baixa da mãe e da tia a apagar o lume e a arrumar a cozinha para se recolherem. A música que ouvia era a mesma das noites em que não se celebrava o Natal: os homens a subirem as vozes, primeiro um, depois outro, depois todos juntos, na taberna da rua da frente.