domingo, 18 de agosto de 2013


(Minha avó, olha… Tantas vezes me lembro de ti, mas hoje, sabes, passei por aquele arco do castelo que leva para fora da cidade, das Portas de Moura, onde fazia com o carro uma curva apertada, quando vinha de te trazer do lar e te levava às horas no moinho, a veres as ruas e as pessoas. Passei por ali e foi a tua voz que me lembrou, quando dizias, sempre, "Cuátela, filha", assim mesmo, baixinho, com um muito doce "u" anteposto, a tua voz que tremia um bocadinho só, de beleza e coisa frágil, e pensei. Pensei que às vezes me surpreende por mais me cativarem vozes de cantoras que de homens cantantes, e fica assim percebido: que foi da doçura da tua, de outras como a tua voz, que me ninaram, que me alertaram, que me ralharam, que cantavam, davam instruções, vozes baixas de discretas e discretas, de canseiras e cuidados de cuidar. É isto, avó, que a tua voz não está aqui já e está aqui ainda.)