Os dias de Verão na aldeia eram dias de férias grandes. Isso queria dizer que não havia aulas e, portanto, que se aliviava a disciplina na casa. Mas dormir até tarde não estava nos hábitos da família. Se se dormia na casa da mercearia, aos dias de semana acordava-se ao som dos primeiros fregueses: antes das oito da manhã, que a partir das dez, onze, o calor obrigava a fechar a porta. O domingo era diferente. O Reboliço começava a despertar quando a luminosidade da manhã entrava pela telha de vidro, a única abertura do quarto grande (além da porta), onde dormia na mesma cama com a Mana, ao lado da cama do Mano. Não servia de nada encher aquele vão translúcido, esticar a cana de mais de dois metros e empurrar o papel pardo: o sol chegava ao dia e as paredes começavam a amarelecer, a cómoda e o guarda-fatos a ser mais do que sombras indefinidas, as cornucópias de ferro da cabeceira da cama a desenhar-se atrás dela, a traço cinzento escuro na cal. Acordavam as cores e as formas. Os barulhos vinham depois: duas vozes na cozinha, quebradas pelo arco do corredor e pelas estantes da despensa, que se ouviam mais límpidas quando a mãe ou a tia iam da cozinha para a despensa, vinham do quintal ou por alguma razão passavam a falar no corredor, para onde dava directamente a folha de madeira que era a porta do quarto. O Reboliço tinha dois passatempos: primerio, tentar distinguir qual das duas falava; quando se decidia, era sinal de já estar bem desperto. Depois, esperar pelo momento em que uma das duas, normalmente a mãe, se lembrava deles ("E aqueles moços, não acordam?"). Não tardavam depois dessa frase mais do que dois ou três minutos até que ela entrasse quarto adentro: "Meninos, vamos lá - levantar!" Vinham as cócegas, os ralhetes, os lençóis para trás, o dia inteiro à frente deles.