sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Moinhos na Poesia (73)


MOVENDO A MÓ

Evidentemente, apenas preciso
de comparar o silêncio do céu
com o ruído da terra.

Evidentemente, nenhum barulho
das coisas visíveis corresponde
ao movimento dos astros ou
dos anjos.

Mas os planetas, cujo círculo
se desloca para o céu da boca,
rangem, como se fosse um gemido.

Lembram-me um corpo a cujo abraço
se regressa, por fim, como o trigo
deitado na roda do moinho:

e onde reconheço o calor das mãos,
o murmúrio do vento nos ouvidos,
o espasmo do amor no cansaço da pedra.
(Nuno Júdice, Meditação em Ruínas, Lisboa, Quetzal, 126.)