terça-feira, 27 de dezembro de 2005

Sal da vida

O Reboliço teve uma prenda de sal, que muito apreciou e que retribui com uma história.
Há dois anos, viajou de visita a um amigo. Jussi Huovinen mora longe, numa povoação isolada do leste da Finlândia, quase em cima da fronteira com a Rússia. No Inverno, ele e a mulher são os únicos moradores do lugar, que tem mais seis ou sete casas. A menor distância que têm de percorrer para encontrar outras famílias é quarenta quilómetros. Nessas alturas, o que lhes vale é a neve, o frio e o recorte branco das árvores e do lago que desenham a linha política que não divide a Carélia. No Verão, o lugarejo anima-se com as outras famílias, a variação entre o azul do céu e o verde da água e das árvores, o castanho da madeira das casas.
O Reboliço tinha-o conhecido no Inverno, e voltou a visitá-lo num Verão. Saudou-o com pedras de lugares longínquos, prendas de outras mãos amigas: levou-lhe um frasco pequeno, cheio com flor de sal das ilhas Selvagens. Quando lhe explicou o que era, o velho Jussi chamou a mulher, o filho, a nora e os netos - "Vejam, é sal do oceano." O Reboliço não se lembra de distinguir entre o brilho daquelas pedras brancas sobre a mesa de madeira e os olhos de todos os que as observavam e nelas viram a espuma branquinha no azul das ondas.