segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Passou o amola-tesouras

(Foto: Reboliço. O Reboliço lembra-se de ouvir chamar o amola-tesouras: começava o som ao longe, a subir e a descer o som agudo, depois desaparecia quando passava atrás de algum prédio mais largo e, ao fim de alguns segundos, reaparecia já, tão distinto que, mesmo sem o ver, sabia que entrara na sua rua. Esta manhã ouviu-o duas ou três vezes antes de se levantar do descanso e abrir a janela para o ver melhor. Viu o homem levar a bicicleta pela mão, subir a rua em silêncio e, das duas vezes que parou a meio dela, levar aos lábios aquela espécie de gaita ou pífaro e fazer o som de chamada. Mais nada nem ninguém se mexeu na rua. O homem olhou para trás de si, só um momento, como se tivesse passado alguém, que afinal não havia, e voltou a fazer andar a bicicleta. Entre os sons agudos da gaita de beiços, ia murmurando um fado sem palavras.)