sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Napoleão



O Reboliço saiu lançado do quarto para o corredor escuro, a caminho da cozinha e da janta. Nem dois passos, e truz! um pontapé numa coisa dura, que o pôs a ver as estrelas que as nuvens de chuva encobriam na cidade. "Raios," pensou. "Há-de ser um dos brinquedos do Nitchi." (É Nietzsche, o nome do cão daquela casa, mas a voz que sai dos donos quando o chamam diz assim.) Vai, pata magoada ante pata sã, acender a luz do corredor para ver o que chutou. Mal se ilumina a alcatifa, abre muito os olhos, inclina a cabeça para trás, incrédulo, aproxima-se de novo para ver melhor, agacha-se sobre o vulto do tamanho de uma bola de râguebi, e ouve atrás de si a voz da dona daquilo.


 (Fotos do Napoleão: Reboliço. Apesar do olhar ameaçador,  
a tartaruga de pata vermelha, ou jabuti-piranga, é plácida e respira devagarinho.)

"É a nossa tartaruga. Cremos que seja fêmea, mas lhe demos nome de macho. É Napoleão." O Reboliço toca-lhe na linda carapaça desenhada, afaga-lhe as patas carnudas, uma de cada lado da forma ovalóide, a confirmar que nada ficara quebrado, e passa a andar pela casa só de luzes acesas.


 (Foto do desconfiado do Nietzsche: Reboliço)