segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Quitute

O Reboliço acorda cedo, à primeira luz que a manhã dá. Cedo demais para sair, para fazer barulho, para descer ao café da manhã. Então, agarra num dos livros que encontra sobre o criado mudo e fica a ler. Ontem recebeu de presente - um presente que encomendara - A Cozinha da Alcobaça, volume com histórias e receitas de uma professora reformada, Laura Góes, que hoje dirige o que se chamaria um hôtel de charme, na Serra Fluminense. Abriu o livro pela manhãzinha, só para voltar a ganhar sono e somar uma hora ao sossego, mas em pouco tempo tinha percorrido metade das páginas. Sem ademanes nem floreados, a escrita vai directa ao assunto: comida. Por isso é tão fácil e mesmo as diferenças vocabulares se explicam todas por si só, desfeita mais meia frase ou meio parágrafo. Ou melhor, nem todas. A certa altura, a autora refere-se a uma sobrinha sua, "consagrada quituteira em São Paulo", e o Reboliço pensa que será alguma espécie de cozinheira afamada - mas "quituteira" é-lhe absoluta novidade. Nunca vira, ouvira, ou imaginara que existisse aquela sequência de sons com algum sentido. Desfaz depressa o mistério e percebe que se trata de uma espécie de fabricante de petiscos doces, alguém que se dedica aos amuse-bouches com que se entretém a vontade de comer. Mas só quando chega à etimologia se queda e regressa ao sono: parece que vem da palavra kitutu, que em língua quimbundo significa indigestão.