quarta-feira, 23 de maio de 2007

O Deserto dos Tártaros (ou, Ainda não me cansei)

VI

A lua voltada para o tempo em que, de um coração
novo, arrancava mais lampejos do que vidros,
na violência do silêncio, quase
silente pela dor de ver-me
tomado, ganha com cega demora
a estrada velha. E, outra vez, algum vidro
aqui em baixo arde, e alguns trilhos
varridos pelo vento, de terra nua.
Mas é no céu que se amontoa, como
- porque estou cansado - se estivesse cansada
e desiludida toda a terra, a grande luz;
só o cosmos dela é invadido, já não
estes nossos bairros; se uma reverberação
um mísero reflexo tem vida ainda
é para significar que a lua
está voltada para onde não há vida.

(Pasolini, Poemes de Jeunesse [dos poemas póstumos escritos entre 1950 e 51]; p.114; o post chama-se assim porque me lembrei deste poema a propósito do livro de Buzzati. Logo venho deixar a versão original, para o Mano, se quiser, dizer de sua justiça.)