quinta-feira, 28 de junho de 2012

Urban farmers

O Reboliço entra no táxi e mal percebe uns ruidozinhos baixos. Assim que o motor arranca, ouve, mais distintamente, duas ou três linhas de som, de uns sons ritmados, trri trri, trri, alguma peça solta, para trás do banco de trás, ouve melhor e sabe que quer identificar. Procura o ritmo, que afinal não há, enquanto o som se vai tornando mais persistente, mais alto. Um som quase metálico, mas só metaforicamente metálico, desalinhadas as linhas, o ritmo anulado, não é som de peça, é som de alma - até que distintamente escuta alguma coisa que toca nalguma outra coisa que é metal sem ser maneira de dizer. A grade de uma gaiola, de certeza. E o trrtrri, trri, trri contínuo. São pintainhos, pensa o Reboliço. O táxi leva pintainhos. "Parece que leva pintos aqui no carro..." - "Diga?..." - "Pintos, ouço como se fossem pintos, aqui atrás." "Ah. São melros - três melros. Tenho que andar com eles, que são novos e precisam de estar sempre a comer e não tenho com quem os deixar. São três melros. Eu gosto de ouvir cantar os melros, não sabe? São pequeninos - ontem não tinham nenhuma, nem cantavam ainda; hoje já estão todos tapadinhos de penas, assim que ligo o motor pedem-me comida. Em parando já vou ali atrás, já lhes dou mais um bocadinho. São três melros, que eu gosto muito de os ouvir cantar."