segunda-feira, 22 de outubro de 2012

De madrugada

O Reboliço espreguiça-se: primeiro as patas da frente, depois as de trás, lombo esticado, roçado contra o umbral da porta, boceja um bocejo longo e, num gesto que o surpreende, levanta uma das orelhas, direita, fuso erguido e aberto. "Shhhrriiippshrrr," escuta o melro da árvore. Nem um raio de sol ainda, nem a claridade: um arrepio só foi o que fez o pássaro reagir e produzir som, um tremer de penas com a aragem que a gota de chuva provocou a passar de uma folha a outra, nada mais. Nada mais poderia ser, que nenhum insecto ainda vive, nenhum verme se arrasta, nenhum raspelhinho acordou. Arrepio, pensa o Reboliço. Pobre melro, que se calou, só com duas patas tão finas para dar sobre algum ramo pequeno uma volta, meia volta, e escolher de novo a posição do sono.